Ao
depararem-se com uma capelinha perdida junto à desolada foz do
Sorraia, poucos saberão as peripécias por que passou o santo do seu
orago.
São
Batráquio nasceu em Sarilhos Pequenos numa família de apanhadores
de amêijoas. Moço calado e solitário,
desde cedo manifestou problemas de relacionamento e comportamentos
desviantes. Era presa frequente de terrores noturnos e várias vezes
desapareceu de casa, sendo sempre encontrado escondido em locais
isolados, como casebres em ruínas ou abrigos de pescadores em
canaviais. Mostrando-se avesso à apanha de bivalves, acabou por
aceitar tarefas...
10/02/2022
10/01/2022
Meia dúzia de safanões
Em 10.1.22
por joaquim bispo
«O
novo panorama terrorista mundial obriga-nos a gastar muitos recursos
e a equacionar outras formas de guerra.» — alertava a caixa
introdutória do artigo da revista. O assunto interessava a Patrício
Neves. Verificou as outras “gordas”: «Até aonde devemos ir no
combate ao terror? De quanta humanidade estamos dispostos a abdicar?
Devemos aceitar descer aos níveis de desumanidade dos terroristas,
desde que nos salvemos e aos nossos compatriotas?»
Enquanto
os colegas analisavam o conteúdo de uma escuta à comunicação de
um suspeito, foi lendo o corpo do artigo. De repente, cresceu a
agitação...
10/12/2021
Um gesto ou dois
Em 10.12.21
por joaquim bispo
O
homem tinha a cara enrugada, poucos dentes
e um aspeto decrépito. Teria bem mais de 70 anos e adivinhava-se-lhe
já pouco préstimo para o trabalho do campo. O patrão contratou-o
por um misto de piedade
e oportunidade. Chegou ao monte para guardar o “vazio”, isto é,
o pequeno rebanho de carneiros e de outros ovinos que não estavam
“cheios” — prenhes —, mas também ajudava em inúmeras outras
tarefas da horta e da casa. Havia sempre lenha para cortar e água
para acartar.
Era
por meados da década de 50. O contrato era de 100 escudos por mês e
“de comer”. Ficou a dormir num catre...
10/11/2021
O passeante invisível
Em 10.11.21
por joaquim bispo

Nunca ninguém o viu. Nunca ninguém
se deparou com ele ao dobrar uma esquina, fosse noite ou dia. Mas
nunca ninguém duvidou que ele se passeava invisível
por toda a cidade. Alguns afirmavam ter entrevisto sombras que eram,
indubitavelmente, projeções
da figura fantástica do
passeante invisível.
Outros garantiam ter
ouvido sons abafados, momentâneos
arrastamentos como de
passos,
que comprovavam que ele se passeava por ali.
A
cidade é feita de muitas estruturas artificiais. Físicas e
organizativas. Os homens precisam de um lugar coletivo para viver.
Estarem juntos dá conforto e segurança,...
10/10/2021
O Mestre
Em 10.10.21
por joaquim bispo

No
dia em que comerdes desse fruto,
se
abrirão os vossos olhos;
e
sereis como deuses,
conhecendo
o bem e o mal.
Gn
3,5
― Professor,
quando é que nos mostra
as suas últimas pinturas? ― lançou Gisela, juvenilmente
provocadora.
― Não
as trago para a faculdade, Gisela, que são muito grandes ―
gracejou o professor de Pintura III ―,
mas terei
muito gosto em mostrá-las no ateliê da minha casa de Sintra.
Tinha
uma daquelas figuras tutelares que impressionam algumas alunas ―
sobre o alto, barba, cabelo grisalho farto e um pouco revolto ― e,
sobretudo, dava gosto ouvir as suas...
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