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10/08/2018

A primeira refeição do dia


A primeira refeição do dia é a mais importante.
(Dos sites nutricionistas)

Acabei de chegar de umas férias em Budapeste. Cidade bonita — belos panoramas, excelentes museus —, mas do que não me esqueço é dos pequenos-almoços. Só de antever a primeira refeição do dia passava a noite em sonhos salivados. No hotel em que estive, serviam fiambres, presuntos, chouriços, queijos variados, tudo em cascatas de fatias finíssimas. E doces, frutas, bacon, ovos mexidos, pratos quentes.
Acho que havia hóspedes que só tinham ido a Budapeste pelos pequenos-almoços. Enchiam a chávena de café com leite, e o prato com queijo e carnes frias, iam para a mesa esvaziá-los, voltavam a recarregá-los, uma e outra vez. Abarrotavam tigelas com flocos de milho, de amêndoa, com fibras, com mel, chocolate e fruta. Juntavam leite, iogurte, café, sumos de frutas. Equilibravam pirâmides de fatias de Emmental, chaminés de Chèvre, com a ajuda de morros de Roquefort, acompanhados por arquipélagos de ovos quentes, salsichas fritas e barris de sumo de laranja para empurrar.
Filas de empregados afadigavam-se a repor as provisões nas mesas do bufete. Dezenas de pares de olhos espiavam a sua chegada à porta da copa. Hordas de pretensos esfomeados escudados em pratos vazios preparavam-lhes emboscadas no primeiro ângulo de mesa. Homens da Michelin em banha lançavam-se sobre os acepipes, como gaivotas sobre sobras de peixe, engolindo fatias de salmão fumado enquanto bicavam os adversários mais próximos. Por vezes disputavam a mesma tira de bacon frito ou, em gesto rápido, surripiavam a tosta mista que o vizinho se atrasara a retirar da bateria de tosteiras. Rebatiam com saladas de tomate, de couve roxa, de beterraba. Ou com travessas de ananás, pêssego, melão e maçã.
Ai do que não fosse ligeiro e audaz. Quando chegasse à mesa das carnes frias, já só encontrava um ou outro grão de pimenta; quando chegasse à mesa dos queijos já só sentia o cheiro. O seu empenho incidia então no desenvolvimento de táticas mais eficazes de captura de víveres no fornecimento seguinte.
Por fim, mitigavam a fraqueza com uns doces: potes de compotas, salvas de bolo-mármore, taças de tiramisu, tigelas de mousse de chocolate, travessas de leite-creme.
Quando pareciam saciados, começava a fase de aprovisionamento, porque o dia de visitas turísticas na capital e arredores se adivinhava longo e desgastante. Fileiras de sanduíches recheadas de salpicão, queijo flamengo, pasta de atum, ovo mexido e picles — para desenjoar — alinhavam-se obedientes em camadas sobrepostas no fundo das malas de mão e das mochilas. Alguns convivas preparavam tantas que se esperava encontrá-los a vendê-las nos pontos turísticos mais frequentados, para pagar a viagem. As que sobrassem ainda deviam dar para acabar com a fome em algum país do corno de África.
Budapeste é bonita, mas o melhor são os pequenos-almoços. Inolvidáveis. Ainda esta noite voltei a sonhar que me deliciava com almôndegas à húngara que apanhava às mancheias. Acordei mesmo a tempo de evitar aquela parte desagradável dos garfos espetados nas costas da mão…

Joaquim Bispo
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Imagem: Josefa de Óbidos, Cesto com bolos e toalha, 1660.

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