O
cão avançava pela rua inebriado pelos inúmeros cheiros que
farejava: cadelas, cães, comida. A caminho do parque, o seu dono
soltara-o da trela e dera-lhe liberdade total. E o cão corria
antecipando os prazeres dos grandes espaços.
Era
bom correr. Os membros gostavam da corrida. Corria em grandes saltos
a caminho dos baldios para lá do bosque. E, aí, o labirinto dos
matos, os gafanhotos, os ratos, os lagartos. Corria por entre os
fenos, por trilhos onde só ele cabia. De surpresa, levantavam-se perdizes e fugiam coelhos e lebres. E o cão
perseguia-os, delirante. Não era o instinto da caça, era o prazer
da perseguição.
E
chegou a uma grande clareira onde espinoteava uma dúzia de
cachorros. Santa mãe cadela!
Ladrou
de alegria; os outros deram-lhe as boas vindas, em latidos
cristalinos. Voltearam em perseguições que alternavam com fugas.
Dentes de fora em exibição festiva, na farsa do combate. Este era o
seu dia mais feliz.
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Ladrou
alto e então acordou. Deu por si confinado à varanda do seu dono,
como sempre, e lá em baixo exibia-se, arrogante, o sinistro
Rottweiller do bairro.
Joaquim
Bispo
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Imagem:
Ross B. Young
(1955–),
Pointer & Quail.
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